Fernando Rosa, José Pregun e Sandro ManciniNotícia publicada na edição de 30/12/2008 do Jornal Cruzeiro do Sul, na página 2 do caderno A - o conteúdo da edição impressa na internet é atualizado diariamente após as 12h.Qual é o intuito de uma “seleta coletiva” se não existe coleta seletiva? Qual é a razão de coletar seletiv amente se as pessoas não separam coletiv amente? Todos nós geramos “lixo”, ou seja, somos parte do problema. E da solução.
A Prefeitura de Sorocaba, em 2007, iniciou o Programa Municipal de Coleta Seletiva, dividindo o perímetro urbano do município em seis setores, os quais contêm potenciais estimados semelhantes em termos de quantidade de “lixo” reciclável gerado. Os seis setores, divididos atualmente em doze núcleos, estão distribuídos para o atendimento de quatro cooperativas: Coreso, Catares, Ecoeso e Reviver. A municipalidade disponibilizou recursos para a implantação da infra-estrutura básica para cada núcleo. Por outro lado, as cooperativas ficam sujeitas a conduzirem o seu próprio gerenciamento e assumem o dever de promover a inclusão social de catadores (agora chamados agentes ambientais), incorporando-os ao mercado de forma digna, disciplinada e autônoma.
Um estudo desenvolvido pela Unesp diagnosticou e avaliou o atual sistema de coleta seletiva de Sorocaba a partir do levantamento dos procedimentos e do cotidiano da cooperativa Reviver, que atende a região nordeste da cidade, incluindo bairros como Iguatemi, Morumbi, Saira, Leocádia, Progresso, Abaeté, Éden, etc..
A coleta seletiva funciona com a modalidade “porta-a-porta” não mecanizada, ou seja, os cooperados coletam, através da tração humana, o que a população separa. Eles então puxam carrinhos de aproximadamente 50 quilos e com capacidade de carregar outros 150 quilos de materiais recicláveis, percorrendo rotas relativamente extensas e cansativas, algumas com longos declives (há planos de se acoplar um motor elétrico aos carrinhos). Em outubro de 2008, na área da Reviver existiam 9 rotas diferentes distribuídas por 28 bairros, tendo sido atendidos 2.062 fornecedores (residências, empresas, escolas etc), distribuídos em 215 ruas.
Levantou-se ainda, durante o período de janeiro a outubro de 2008, que a média de materiais comercializados pela cooperativa é de 35 toneladas/mês, sendo que a meta estabelecida para cada cooperativa é de 400 toneladas/mês. Por outro lado, e o mais interessante, é que a média de materiais comercializados por cooperado atinge 2 toneladas/mês, exatamente o que é previsto pelo Programa. Ou seja, os agentes ambientais realmente estão cumprindo com suas responsabilidades, cada um desviando 67 kg/dia de materiais recicláveis do aterro sanitário. Como os cooperados recebem pelo que coletam, de janeiro a outubro de 2008 a média financeira que cada um atingiu foi de R$ 473,00 por mês, já descontados o INSS e a taxa administrativa, esta última utilizada para o pagamento de despesas da cooperativa.
Como conclusão, ainda são poucos os cooperados: o número mínimo de agentes ambientais na Reviver foi de 14 em janeiro e o máximo de 21 em agosto de 2008. Há, porém, uma série de “catadores” de rua, que não se sentem atraídos pelo trabalho nas cooperativas e que acabem competindo com elas.
A adesão da população ainda deixa a desejar. Muitas residências não são cadastradas à cooperativa por preguiça de realizar a separação, ou por não querer acumular material em casa ou assumir o compromisso, alegando não ter tempo para separar e tão pouco para fornecer o material em dia e hora específicos. Muitos moradores dispostos a colaborar se equivocam ao achar que os cooperados recebem algum tipo de pagamento da Prefeitura e por isso acreditam que os catadores de rua sejam mais necessitados.
Para complicar, a população acaba descartando uma série de materiais que não são comercializados, muitas vezes por ainda não existir mercado para estes resíduos ou por estarem muito sujos. É importante que sejam entregues somente materiais que as cooperativas consigam vender, evitando, por exemplo, isopor, espumas, filtros de café usados, tecidos velhos, latas de tinta e solventes, cerâmicas, recicláveis muito contaminados, restos de comida, embalagens metalizadas (biscoitos, salgadinhos, etc.), lixo de banheiro, adesivos, entre outros. É necessário, principalmente para algumas embalagens como caixas de leite, que seja feita uma breve limpeza, para evitar problemas relacionados com odores e atração de insetos e outros animais.
Afinal, qual é o intuito de uma “seleta coletiva” se não existe coleta seletiva? Qual é a razão de coletar seletivamente se as pessoas não separam coletivamente? Todos nós geramos “lixo”, ou seja, somos parte do problema. E da solução.
Fernando Salles Rosa é engenheiro ambiental formado pela Unesp-Sorocaba (www.sorocaba.unesp.br) e autor do estudo; José Carlos Pregun é agente ambiental da cooperativa Reviver e Sandro Donnini Mancini (mancini@sorocaba.unesp.br) é professor da Unesp-Sorocaba e o orientador do estudo.