Em junho passado, um fato de causar espanto foi notícia no mundo inteiro: algo em torno de 90 contêineres, abarrotados com mais de 1.600 toneladas de lixo do Primeiro Mundo, repletos de artigos de qualidade, usados e jogados fora, chegava ao Brasil pelos portos de Santos (SP) e Rio Grande (RS). Lixo inglês de qualidade!À primeira vista, parecia lixo comum. Nossa, pensei, como e por que esse lixo veio parar no Brasil? Descobri que, na verdade, esse monte de resíduos compunha-se de sacos plásticos (sempre eles!), papel, pilhas e baterias, brinquedos (com instruções de “lavar antes de usar”), remédios vencidos, fraldas descartáveis e até seringas – lixo hospitalar. Ou seja: resíduos que poderiam ser reciclados em terras inglesas. Parece que alguns insetos que também conseguiram embarcar estavam nos contêineres.Também ouvi dizer que essa prática pode estar acontecendo há mais tempo: contêineres com refugo do Primeiro Mundo estariam aportando também em solo africano. Seja na África ou no Brasil, o fato é que sabemos que países evoluídos economicamente têm condições de reciclar, reutilizar o próprio lixo; e dispor de forma apropriada, se for tóxico. Por que envir o refugo para as latitudes do Sul?Uma possibilidade seria o interesse de empresas brasileiras em comprar esse lixo tóxico. O incidente, então, não teria sido um equívoco, conforme noticiado.Pesquisando na Internet (statistics.gov.uk) descobri que o Reino Unido tem uma população de pouco mais de 61,4 milhões de habitantes e que cada um produz, em média, quase meia tonelada de lixo por ano. Destes, 35% são reciclados.Já o Brasil, segundo dados fornecidos pelo IBGE (2007), conta com quase 184 milhões de habitantes que produzem, diariamente, uma quantidade considerável de resíduos – são coletadas todo dia mais de 228 mil toneladas (84 milhões de toneladas por ano). Ou seja, cada brasileiro produz, em média, quase meia tonelada de lixo anualmente (é um dado médio, e sabemos que nem todos os brasileiros produzem essa quantidade!). Você deve estar se perguntando o porquê de todos esses cálculos e eu explico: um país que produz a mesma quantidade de resíduos domésticos que o Brasil mas tem um terço da nossa população não pode querer enviar seu lixo para ser tratado aqui, pode?O desfecho da história parece ter um final feliz (para nós): em 21 de agosto chegaram ao porto britânico de Felixstowe, um dos maiores do Reino Unido, quase todos os contêineres (nem todos!) de volta. O bom foi saber que as empresas envolvidas no caso (estariam mesmo importando o lixo?) foram multadas por terem infringido normas nacionais (resolução do Conselho Nacional do Meio Ambiente) e normas internacionais (Convenção da Basileia, que regula a destinação de resíduos perigosos dos países industrializados). Resta, contudo, saber se os demais contêineres também tiveram destinação final europeia...
___________________________________________________________________ Fonte: Revista Seleções – Outubro de 2009
Mariusa Colombo é bióloga, especialista em Saneamento Ambiental e mestre em Desenvolvimento Sustentável e Gestão de Sistemas Agroambientais da Universidade de Bolonha, Itália.
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